EN
Que proteção dá a legislação laboral ao doente oncológico em Portugal? Sabe quais são os direitos previstos?
Imprensa
|
in Forbes
01 nov 2023

Que proteção dá a legislação laboral ao doente oncológico em Portugal? Sabe quais são os direitos previstos?

Que proteção dá a legislação laboral ao doente oncológico em Portugal? Sabe quais são os direitos previstos?

Nesta semana em que decorre o peditório da Liga Portuguesa Contra o Cancro em todo o território nacional (de 1 a 5 de novembro), fomos perceber que grau de proteção gozam os trabalhadores oncológicos.

O cancro, também reconhecido como a “doença do século”, é já considerado o principal problema de saúde pública a nível europeu. Os níveis de incidência em Portugal são cada vez maiores, apontando as estimativas para o surgimento anual de cerca de 60.000 novos casos de doença oncológica.

Nesta semana em que decorre o peditório da Liga Portuguesa Contra o Cancro em todo o território nacional (de 1 a 5 de novembro), fomos conhecer junto de especialistas em legislação que grau de proteção é conferido no mundo do trabalho aos doentes oncológicos.

Filipa Ribeiro Gonçalves, da sociedade de advogados Dower Law Firm afirma que “o legislador português tem percorrido algum caminho no que respeita à tutela jurídica da doença oncológica no contexto da relação laboral, consciente de uma realidade que, afetando cada vez mais pessoas (e famílias), tem um incontornável impacto na vida profissional”

Na perspetiva desta especialista, as mais recentes alterações ao Código do Trabalho – de 2019 e 2023 – são impactantes e reflexo disso mesmo, “não se ignorando que, pese embora não se possa dar a jornada por encerrada, passos certeiros foram dados na direção desejada”.

Em termos genéricos, “e circunscrevendo-nos ao plano da relação de trabalho – pois que, fora desse âmbito, outros direitos são reconhecidos ao doente oncológico -, o regime de proteção especificamente previsto no Código do Trabalho pode desdobrar-se em duas vertentes”, refere Filipa Ribeiro Gonçalves: direitos reconhecidos ao (próprio) trabalhador portador de doença oncológica; e direitos reconhecidos ao trabalhador progenitor de filho com doença oncológica.

Esta advogada leva-nos a conhecer, de forma sumária, alguns desses direitos:

  • Igualdade no emprego e condições de trabalho

“Desde logo, a lei laboral é perentória ao afirmar que, sem prejuízo das especificidades inerentes à sua situação, o trabalhador com doença oncológica é titular dos mesmos direitos e está adstrito aos mesmos deveres dos demais trabalhadores, seja no acesso ao emprego, na formação, na promoção ou carreira profissionais, ou nas condições de trabalho.

O empregador deve também adotar medidas adequadas para que a pessoa com doença oncológica ativa em fase de tratamento tenha acesso a um emprego, o possa exercer e nele progredir, ou para que tenha formação profissional (salvaguardando-se a hipótese de tais medidas implicarem encargos desproporcionados).

Compete, por sua vez, ao Estado estimular e apoiar a ação do empregador na contratação de trabalhador com doença oncológica, na sua readaptação profissional, e no cumprimento dos demais objetivos identificados”.

  • Dispensa da prestação de trabalho noturno, em regime de adaptabilidade, banco de horas e horário concentrado

“Sempre que tal prejudique a sua saúde ou segurança no trabalho, o trabalhador com doença oncológica ativa em fase de tratamento é dispensado da prestação de trabalho:

  • noturno (entre as 20h de um dia e as 07h do dia seguinte);
  • em regime de adaptabilidade (definição do período normal de trabalho em termos médios);
  • em regime de banco de horas (aumento do período normal de trabalho e respetiva compensação);
  • em horário concentrado (concentração do período de trabalho semanal em menos dias, mediante aumento do período normal de trabalho diário).

Para este efeito, antes de se iniciar a aplicação do horário em causa, o trabalhador deve ser submetido a exame de saúde”.

  • Dispensa de prestação de trabalho suplementar

“O trabalhador com doença oncológica não é obrigado a prestar trabalho suplementar (designadas ‘horas extra’), mesmo quando tal lhe seja expressamente solicitado ou determinado pelo empregador”.

  • Licença para assistência a filho com doença oncológica

“O trabalhador progenitor tem direito a licença por período até seis meses, por regra, prorrogável até quatro anos, para assistência a filho com doença oncológica. Pese embora a situação implique a perda de retribuição, o trabalhador beneficia de proteção social, concretizada na atribuição de um subsídio”.

  • Direito ao regime de teletrabalho

“O trabalhador com filho com doença oncológica (que com ele viva em comunhão de mesa e habitação) tem direito a exercer a sua atividade em regime de teletrabalho, sem necessidade de acordo do empregador, e sem que este possa opor-se, desde que o teletrabalho seja compatível com a atividade desempenhada e o empregador disponha de recursos e meios para o efeito”.

Por outro lado, acrescenta esta advogada da Dower Law Firm, “vindo o cancro a qualificar-se como uma doença crónica, há um outro feixe de direitos que pode ainda ser considerado”, designadamente o direito a faltar justificadamente para prestar assistência inadiável e imprescindível a filho com doença crónica, até 30 dias por ano ou durante todo o período de eventual hospitalização. Outro direito que tem essa pessoa diz respeito à possibilidade de redução do tempo de trabalho (equivalente a 5 horas do período de trabalho semanal) para assistência a filho com doença crónica, com idade não superior a 1 ano.

Este trabalhador tem ainda direito a trabalhar a tempo parcial, situação prevista para o trabalhador com filho com doença crónica, que com ele viva em comunhão de mesa e habitação.

Outro direito que está consagrado é o de praticar horário flexível, para o trabalhador com filho com doença crónica, que com ele viva em comunhão de mesa e habitação (podendo o trabalhador escolher, dentro de certos limites, as horas de início e termo do período normal de trabalho diário).

Por fim, esta especialista aponta ainda o direito a faltar justificadamente, até 15 dias por ano, para prestar assistência inadiável e imprescindível a pessoa com doença crónica, que seja cônjuge ou com quem viva em união de facto.

“O acesso aos direitos acima mencionados dependerá, naturalmente, da observância de um conjunto de requisitos e procedimentos especificados na lei. Por sua vez, a violação dos referidos regimes, pelo empregador, constituirá contraordenação laboral (por regra, grave ou muito grave), sujeitando-o ao pagamento de elevadas coimas”, finaliza a advogada Filipa Ribeiro Gonçalves, da Dower Law Firm.