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Novas alterações ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial
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15 abr 2025

Novas alterações ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial

Novas alterações ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial

Havíamos já indicado que, em 30 de dezembro do ano transato, tinha sido publicado o Decreto-Lei n.º 117/2024 que introduzia alterações significativas no Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT).

Em traços gerais e relembrando o já desenvolvido, o referido Diploma, que encontrava sua fundamentação (pelo menos no entendimento do Presidente da República) na urgência da utilização dos fundos europeus e no fomento da construção para fins habitacionais, procedia à criação do conceito de habitação a valor moderado e a possibilidade de reclassificação para solo urbano com finalidade habitacional e usos complementares, desde que cumpridos determinados pressupostos.

Volvidos quase quatro meses, surge uma alteração ao referido Diploma, introduzida pela Lei n.º 53-A/2024, de 9 de abril, pelo que, se impõe indicar as principais mudanças:

 

  • Eliminação do conceito de habitação de valor moderado

A possibilidade de proceder à reclassificação do solo rústico para solo urbano, introduzida pelo Decreto-Lei n.º 117/2024, de 30 de dezembro, dependia, entre outros, da afetação de, pelo menos, 70% da área total de construção acima do solo a habitação pública ou habitação de valor moderado.

A habitação a valor moderado correspondia àquela em que o valor por m2 da área bruta privativa não excede o valor da mediana de preço por de venda por m2 de habitação para o território nacional.

Pois bem, o conceito vindo de mencionar apenas vigorou durante pouco mais do que três meses, tendo sido eliminado com a Lei n.º 53-A/2025, de 9 de abril.

 

  • Alargamento do leque de finalidades permitidas na construção em solo rústico

Com a eliminação do conceito de habitação a valor moderado, procedeu-se ao alargamento do tipo de habitações que podem integrar os 70% exigidos para a reclassificação do solo.

A par da habitação publica, contemplada já na alteração de dezembro do ano transato, surge a possibilidade de 70% da área total de construção acima do solo se destinar a arrendamento acessível, nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 68/2019, de 22 de maio, ou a habitação a custos controlados, em apelo ao preceituado na Portaria n.º 65/2019, de 19 de fevereiro.

 

  • Concretização de “usos complementares”

A redação inicial da alteração introduzida ao n.º 1 do artigo 72.º-B do RJIGT previa que os Municípios podiam determinar a reclassificação para solo urbano “sempre que a finalidade seja habitacional ou conexa à finalidade habitacional e usos complementares”. Porém, não desenvolvia o conceito de usos complementares, permitindo, portanto, diversas interpretações.

Assim, clarificou-se que se consideram como usos complementares “todas as funcionalidades em relação de dependência ou de complementaridade com a finalidade de habitação, não podendo ser com ela conflituantes”.

 

  • Alteração dos pressupostos da reclassificação

Para que fosse possível a proclamada edificação em solos rústicos, exigia-se o preenchimento cumulativo dos seguintes pressupostos:

  1. Fosse assegurada a consolidação e a coerência da urbanização a desenvolver com a área urbana existente;
  2. Pelo menos 70% da área total de construção acima do solo se destinasse a habitação pública ou habitação de valor moderado;
  3. Fosse delimitada e desenvolvida uma unidade de execução;
  4. Existissem ou fossem garantidas as infraestruturas gerais e locais, bem como os equipamentos de utilização coletiva e os espaços verdes adequados para cobrir as necessidades decorrentes dos novos usos;
  5. Fosse compatível com a estratégia local de habitação, carta municipal de habitação ou bolsa de habitação.

Ora, o único pressuposto que se manteve inalterado corresponde à necessidade de ser delimitada e desenvolvida uma unidade de execução.  

Relativamente ao pressuposto vertido no ponto 1., impõe-se, atualmente, que seja assegurada a contiguidade com o solo urbano, assegurando-se a consolidação e coerência da urbanização a desenvolver com a área urbana existentes.

Eliminou-se, ainda, a necessidade de existirem ou serem garantidos os equipamentos de utilização coletiva e os espaços verdes adequados para cobrir as necessidades decorrentes dos novos usos

Por fim, apenas se exige a compatibilidade com a estratégia local de habitação, carta municipal ou bolsa de habitação “quando exista”.

 

  • Clarificação das consequências da ausência de inclusão das regras de classificação e qualificação nos planos

Como é consabido, desde a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 80/2015, de 14 de maio que se exige à Administração que contemple, nos planos municipais e intermunicipais, as regras de classificação e qualificação previstas no referido diploma.

Esta obrigação, que deveria ter sido assegurada no prazo de cinco anos a contar da data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 80/2015, de 14 de maio, tinha vindo a ser sucessivamente prorrogada, originando que diversos Municípios, até à presente data, não tenham vertido nos seus planos tais regras.

Com vista a forçar a Administração a prever tais regras nos seus planos, havia sido determinado que o incumprimento por facto imputável àquela implicava a suspensão do direito de candidatura a apoios financeiros comunitários e nacionais que não fossem relativos à saúde, educação, habitação ou apoio social.

O Decreto-Lei n.º 117/2024 eliminou a possibilidade de suspensão do direito de candidatura a tais apoios e determinou que ficavam automaticamente suspensas, até à inclusão das regras de classificação e qualificação, as normas relativas às áreas urbanizáveis ou de urbanização programada, não podendo, nessa área, haver lugar à prática de quaisquer atos ou operações que implicassem a ocupação, uso e transformação do solo.

Considerando as divergências que surgiram na interpretação do presente regime, optou o legislador por clarificar que a suspensão vinda de referir não era automática, devendo ser decretada pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) territorialmente competente.

 

  • Previsão de que o presente regime é excecional e temporário

O Diploma em crise previu que as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 117/2024, de 30 de dezembro, apenas irão vigorar durante quatro anos a partir da data da respetiva produção de efeitos, ou seja, desde 31 de dezembro de 2024.

Não obstante, acautelou-se a possibilidade de ser prorrogado o prazo vindo de mencionar, sendo que tal prorrogação é precedida da apresentação e discussão na Assembleia da República, pelo Governo, de um relatório da aplicação do presente Diploma, que sustente a decisão.