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Há sempre alguém que resiste
Imprensa
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in JN
25 abr 2023

Há sempre alguém que resiste

Há sempre alguém que resiste

Vivemos tempos estranhos.

Numa manhã da semana passada, o meu filho Dinis, com quem tenho o privilégio de conversar no caminho diário para a escola entre o som das notícias da rádio, pergunta-me, do alto dos seus 9 anos, quem é que iria fazer greve naquele dia. Fiquei surpreendido com a questão, mas lá fui explicando que os professores, os médicos, os oficiais de justiça, os trabalhadores dos Comboios de Portugal, entre outros, têm andado descontentes com as suas condições de trabalho e com a falta de resposta do Governo e que, por essa razão, têm feito greve, na esperança de que algo mude.

Depois de numa simples resposta enunciar o actual estado da arte, dei por mim a pensar, agora em modo silencioso, que País iremos entregar às novas gerações. E nesses segundos seguintes, fiquei feliz pelo facto de o meu filho ainda não ter demonstrado interesse pela dossier da TAP, atenta a notória dificuldade que eu teria em explicar - pelo menos de forma lógica - a história bizarra do "desaparecer" jurídico e de todos os outros episódios da novela recente da companhia aérea.

Mas depois tudo está bem.

Ouvimos discursos, proferidos com musicalidade convicta, de quem vive num mundo paralelo, mas que tem a batuta para nos governar e a responsabilidade sobre o nosso destino colectivo.

Ora, os vícios de que padece o regime político estão identificados e têm a tendência histórico-esquizofrénica de se repetir, bastando ler Eça, Orwell ou mais recentemente Fukuyama para o perceber.

Hoje, porventura como ontem, ouvimos mentiras descaradas por parte de quem responsabilidades políticas, posições inexplicáveis acerca da invasão russa e uma falta de responsabilidade e de sentido de Estado que faz corar de vergonha os portugueses.

Talvez seja tempo de chamar novamente os trovadores de Abril, para transmitir a alguns dos nossos governantes que, nas certeiras palavras de Manuel Alegre que nos chegaram aos ouvidos pela incomparável voz de Adriano Correia de Oliveira: "Há sempre alguém que resiste/Há sempre alguém que diz não".

Cumprir Abril passará sempre por lutar pela liberdade, mas hoje passará seguramente por agir e dar credibilidade e seriedade às nossas instituições, sob pena de termos muita dificuldade em explicar aos nossos filhos a passividade com que deixamos chegar o nosso País a este ponto.